Baseado na incrível história real.
Mais conhecido pelos seus papéis icônicos no cinema, como Max Rockatansky (‘Mad Max’) ou o policial Riggs (em ‘Máquina Mortífera’), Mel Gibson sempre teve a mão pesada na hora de escolher os temas dos filmes que iria dirigir. Seus filmes são repletos de complexidade dramática, sustentados por temas fortes e polêmicos como heroísmo, sacrifício, fé e religião, por exemplo. Seu trabalho mais recente, chamado por aqui de ‘Até o Último Homem’ contém todos esses elementos e ainda vai mais além, explorando também um drama familiar e uma história de romance, tendo como cenário um evento real ocorrido durante a Segunda Guerra Mundial.
Em ‘Até o Último Homem’, Desmond Doss (Andrew Garfield) é um jovem que se alista no exército para auxiliar as tropas no campo de batalha atuando como médico, porém com um detalhe importantíssimo: seguindo suas ideologias, ele se recusa a tocar em um rifle ou matar alguém. Para Desmond, seu objetivo na Guerra é salvar vidas, e não tirá-las. Obviamente, a situação acarreta vários problemas de relacionamento dentro do quartel, que tornam a missão de Desmond ainda mais difícil. Pela frente, está Hacksaw Ridge, a muralha japonesa que os norte-americanos precisam conquistar para ficar mais perto da vitória. O roteiro é coescrito por Robert Schenkkan (da incrível série de guerra ‘O Pacífico’) e Andrew Knight, do recente filme dirigido e estrelado por Russell Crowe ‘Promessas de Guerra’.
Após um começo construído de forma bem paciente, focando na infância de Desmond e na relação conflituosa com seu pai autoritário e violento, o filme realmente engrena após a chegada do protagonista no quartel do exército, justamente quando os roteiristas começam a contar a história que mais dominam. Apesar da excelente atuação de Hugo Weaving, realmente passando credibilidade no papel de um homem nitidamente atormentado pelos horrores da guerra na qual lutou, com o agravante de ter perdido seus melhores amigos em batalha, e dos esforços de Vince Vaughn, Sam Worthington e Teresa Palmer – que interpreta o par romântico de Desmond – o ritmo do filme é ligeiramente irregular e a mensagem de fé que começa a ser construída ainda é pouco convincente, fazendo alguns espectadores se cansarem nos primeiros 30 a 40 minutos.
Entretanto, aos que resistirem e embarcarem na história, pelo menos a última hora de filme é magnífica, visual e emocionalmente. Quem não se incomodou com o início mais arrastado, vai entender que toda aquela preparação serviu para entendermos melhor tudo o que Desmond passou em sua vida, como o amor e a violência sempre estiveram presentes e de onde ele tirou a verdadeira coragem que lhe inspira. Sob o lema ‘Deus, ajude-me a salvar mais um’, o que este médico fez em batalha é uma das histórias de abnegação mais incríveis que já vi e ouvi na minha vida e nada como um diretor com estilo extremamente visceral como Gibson (vide o seu polêmico ‘A Paixão de Cristo’) para transmitir no filme todo o heroísmo do personagem perante a crueldade em que estava envolvido. Méritos também (é claro) para a espetacular e comovente atuação de Garfield embora – assim como o filme – não impressione tão de cara, mas vai crescendo muito conforme a história avança e as apostas aumentam.
Alguns podem questionar, dizendo que o filme tem um discurso muito ‘patriota’ (como não ser patriota em uma guerra, por Deus?) e que na guerra não há nenhum lado ‘bonzinho’. Moderadamente, eu concordo com essa visão. Mas, é exatamente essa ambiguidade que torna a ideologia e atitude de Desmond ainda mais nobre. Como de costume, Mel Gibson tenta chocar o espectador com cenas fortíssimas de homens em chamas, ratos devorando cadáveres, a crueldade dos próprios companheiros no quartel, toda a pressão psicológica forçando o protagonista a abandonar suas crenças e etc. O interessante é que em momento algum essas cenas parecem desnecessárias ou gratuitas, mas servem para criar tensão, deixando a história muito mais envolvente.
E o que dizer dos discursos de Hugo Weaving, extremamente emotivos? Dizem que todo grande filme tem ao menos uma grande cena, que marca na cabeça por muito tempo. Se for assim, ‘Até o Último Homem’ é um filme gigante, graças a tantos momentos memoráveis e impactantes.
Tecnicamente, a produção é um primor e agrega muito mais valor a uma direção muito competente de Gibson. O trabalho de áudio do filme, somado aos efeitos visuais bastante decentes em tiros e explosões, combinam perfeitamente com a abordagem da direção. Gibson utiliza bem recursos como slow motions e pontos de vista (POV) dos personagens sem abusar, agregando dramaticidade na medida certa e colocando o espectador ‘dentro da guerra’ de maneira primorosa, como apenas os grandes diretores sabem fazer. Parece uma frase clichê dizer que assistir ao filme me deixou ‘tremendo na poltrona’, mas não é exagero algum. As sequências de guerra são tão bem feitas e catárticas que fizeram me sentir exatamente assim. Mas é claro, um filme como este precisa ser apreciado em uma sala de cinema, a que tiver a melhor qualidade de som e imagem possível, diga-se.
OPINIÃO FINAL: Eu saí da sessão achando ‘Até o Último Homem’ provavelmente o melhor filme de 2016, mas sei que muito dessa empolgação foi por conta da sua última hora de tirar o fôlego, que mexeu tanto com meus nervos como pouquíssimas vezes havia acontecido em uma sala de cinema (e, como podem imaginar, eu vou muitas vezes ao cinema todos os anos). Mas, passada essa empolgação, reconheço que o filme tem suas falhas, especialmente de ritmo e roteiro na parte pré-guerra, onde a mão pesada de Gibson deixa o romance brega e exagerado (são pelo menos 4 grandes cenas de beijo).
Colocando na balança, decidi não me incomodar com o início arrastado, pois reconheço como o diretor é bem sucedido ao nos mostrar que, quando se chega a um campo de batalha, nunca se está preparado. Na destruição dos bunkers, você consegue sentir o medo quase real da guerra, com uma brutalidade incrível. E, como não é bobo, Gibson ainda coloca depoimentos dos envolvidos no final, aí é para desabar em lágrimas mesmo. Com grandes atuações, e uma história que inspira fé e coragem, ‘Até o Último Homem’ certamente é um dos melhores filmes de guerra já feitos.
E você, já assistiu ou está ansioso para ver? Concorda ou discorda da análise? Deixe seu comentário ou crítica (educadamente) e até a próxima!