sausage-party-04agosto2016

‘Um herói irá se erguer’.

Já pensou se sua comida tivesse consciência e de repente quisesse evitar seu fim fatídico no estômago de alguma pessoa causando uma rebelião e uma orgia entre os alimentos? Desde a animação ‘South Park’ em 1999 (indicada a um Oscar) e ‘Team America: Detonando o Mundo’ em 2004 – ambos dos mesmos criadores – terem chocado audiências com temas adultos e super polêmicos para os padrões desse gênero no cinema, como sexo e religião, por exemplo, não surgia uma animação tão controversa e maliciosa como ‘Festa da Salsicha’. E quem poderiam ser os responsáveis por esse filme tão ousado, talvez você esteja se perguntando? A resposta é até meio óbvia: Seth Rogen e sua turma, é claro. Enquanto ele, Jonah Hill e Evan Golberg escreviam o roteiro de ‘Superbad’ em 2007, Seth e Jonah tiveram essa ideia em meio a algumas piadas que estavam contando. De lá para cá foram oito anos lançando a ideia em busca de um estúdio que apostasse no sucesso de um filme tão escrachado como esse, até que a Columbia Pictures, em parceria com outras produtoras menores enfim tirou a ideia do papel.

A direção é de Greg Tiernan e Conrad Vernon, dois profissionais experientes no ramo da animação. Curiosamente, Tiernan era mais conhecido por um trabalho totalmente distante de tudo o que é abordado em ‘Festa da Salsicha’, a animação do trenzinho ‘Thomas’. Já a ‘marca’ de Vernon na direção fica bastante evidente já nas primeiras cenas, como na hilária música tema do filme que lembra bastante o número musical em Duloc (‘na cabeça shampoo, lave bem o seu… pé’) no filme ‘Shrek’, considerando que Vernon trabalhou na animação do primeiro filme e ainda dirigiu o segundo. Isso também pode explicar as hilárias referências que ‘Festa da Salsicha’ faz a outros filmes, como ‘O Resgate do Soldado Ryan’, ‘O Exterminador do Futuro 2’ e a Pixar (na placa de um carro vemos a numeração A113, um easter egg bem comum nos filmes do estúdio e como se não bastasse, ainda está escrito ‘Dixar’), haja vista que ‘Shrek 2’ é uma sátira descaradíssima à Disney e suas princesas. Considerando tudo isso e todos os envolvidos no projeto, fica bastante claro perceber que a intenção de Rogen e da direção não foi fazer nada sutil, mas uma verdadeira provocação a tudo o que foi possível abordar em uma hora e meia de filme. E os alvos provavelmente não irão agradar a todos, bom, pelo menos aos mais conservadores ou que se sintam incluídos no show de estereótipos que é o filme em si (sobram para mexicanos, judeus, árabes, índios, jamaicanos e por aí vai).

Apesar do humor de gosto muito duvidoso (nem sei por que explico isso, afinal, é Seth Rogen), o filme acerta bastante no tom da sátira que faz. A qualidade da animação é tão bem feita que ativa na lembrança do espectador o clássico ‘Toy Story’, por exemplo. E não apenas pelo fato de serem, neste caso, alimentos que os seres humanos desconhecem os sentimentos, assim como eles fizeram com os brinquedos, mas pelo fato de conseguirem ‘captar’ a essência do filme da Pixar. Em outras palavras, o filme é muito eficiente em nos apresentar o mundo daqueles alimentos (o supermercado), humanizando a luta pela sua causa e ainda fazendo uma crítica no mínimo interessante ao fundamentalismo religioso, que como sabemos chega a ser bem intolerante com quem pensa diferente. Mas vale ressaltar que o filme não se aprofunda nesta questão, apenas a levanta para que cada um tome para si sua conclusão e reflexão. Ou eles só estavam chapados na hora em que escreveram o roteiro, quem vai saber?

Além desta sátira, a história se passa no 3 de Julho, um dia antes da celebrada independência norte-americana, no supermercado onde conhecemos o protagonista, a salsicha Frank (Seth Rogen). A direção não se preocupa em apresentar vários personagens mesmo sem se aprofundar em todos, porque sabe que pode descarta-los a qualquer momento, pois como um próprio personagem fala em determinado momento do filme, eles são alimentos perecíveis, extremamente manipuláveis e frágeis perante a presença e o desejo dos ‘deuses’, ou seres humanos. É por meio da relação de Frank com os outros personagens que entramos nos outros assuntos polêmicos que o filme aborda, como a liberdade e desejo sexual e também o uso de drogas, esse último um tema muito recorrente na filmografia de Rogen e cia (defensor declarado da legalização da maconha). Uma das cenas fumando chega a lembrar bastante outro filme icônico dos roteiristas, ‘Segurando as Pontas’, escrito por Golberg e Rogen e protagonizado por este último, juntamente com James Franco (que também está no filme, interpreta o humano ‘drogadão’). Completam o elenco Kristen Wiig como Brenda, par romântico de Frank, além de presenças já esperadas como Michael Cera, Paul Rudd, Bill Hader, além das inusitadas presenças de Edward Norton e Salma Hayek. Na versão nacional, há vários integrantes do grupo de humor ‘Porta dos Fundos’ na dublagem, mas a essência do filme permanece, bem como o vocabulário politicamente incorreto. Quanto às insinuações, orgias e cenas sexuais, não há palavras para descrevê-las, portanto, os interessados têm que assistir para entender.

Concluindo, ‘Festa da Salsicha’ é uma das animações mais honestas dos últimos tempos. Entrega justamente o que promete, muita loucura, palavrões, ofensas e muita, mas muita ‘viagem’ pelo universo dos alimentos. O humor nem sempre acerta, chega a um ponto em que vai esfriando quando algumas novidades vão perdendo a força com o passar do filme, mas ainda assim é uma experiência extremamente divertida e descompromissada. Fãs da ‘panelinha’ Superbad devem adorar e possivelmente o filme ficará marcado como o ‘South Park’ de sua geração, até pela falta de concorrência em tempos de ‘anti-bulling’ e ‘politicamente correto’. Comete muitos excessos, mas por incrível que pareça isso não pode ser considerado um defeito por se tratar exatamente da proposta que o filme quis abordar. Imagino a expressão e o que vai passar pela cabeça de alguém desavisado que for assistir ao filme achando que é apenas mais uma animação comum. Mas um aviso deve ser feito: é bem possível que após ver a ‘Festa da Salsicha’, você nunca mais veja os alimentos com os mesmos olhos…

UM MOMENTO APIMENTADO: A cena do ‘Dia D’ parodiando ‘O Resgate do Soldado Ryan’, absolutamente hilária.




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