“Kong: A Ilha da Caveira” escapa de alguns caminhos da tradicional história do gorila

A história do grande King Kong já foi contada várias vezes e eu tenho certeza que você conhece. Tanto o clássico de 1933, quanto o remake de Peter Jackson de 2005 eram sobre uma equipe de filmagem que acaba em uma ilha misteriosa, onde habita um gorila pré-histórico. A criatura sequestra a mocinha e, depois, é capturado para ser exibido como atração em Nova York. A versão de 1976 varia um pouco, nela uma expedição está em busca de petróleo e acaba na ilha de Kong. De qualquer forma, tentam ganhar dinheiro capturando ele mesmo assim…

Embora os seres humanos tenham tendência a considerar tudo o que não conhecem ou conseguem controlar como uma ameaça, vale ressaltar que gorilas não são animais “ruins”. Inclusive, sempre me lembro do gorila Jambo, que vivia em um zoológico nos EUA no final da década de 80, quando um garotinho de 5 anos caiu no seu fosso, bateu a cabeça e desmaiou. Como os gorilas são animais extremamente territoriais, a população entrou em desespero, mas Jambo se aproximou e fez carinho nas costas do menino até ele recobrar a consciência. O garotinho Levan quebrou  um braço e, hoje, pode cuidar tranquilamente de seus dois filhos, muito provavelmente pelo gesto de bondade do “perigoso” animal.

Obviamente, estou contando isso porque a Warner está lançando por aqui essa semana seu mais novo blockbuster: “Kong: A Ilha da Caveira”. Dirigido pelo novato Jordan Vogt-Roberts, o filme faz a escolha certa e, na medida do possível, tenta escapar de alguns caminhos da tradicional história do gorilão, que se repetem a cada vez que um novo filme do King Kong é feito. E isso é muito positivo, por trazer ao espectador aquela sensação de frescor tão importante em uma sequência de filme.

Com um elenco repleto de estrelas, do calibre de Samuel L. Jackson, Tom Hiddleston, Brie Larson e John Goodman, o filme conta a história de uma equipe de exploradores e soldados recém-dispensados da Guerra do Vietnã que vai mapear uma ilha no pacífico onde os seres humanos nunca pisaram os pés. Para a infelicidade de muitos deles, apenas dois integrantes sabiam da fera gigante que habitava a região, mas desconheciam outras ameaças muito piores.

“Kong: A Ilha da Caveira” tem muita influência de seus roteiristas, já experientes em criar histórias de monstros. Max Borenstein é o mesmo roteirista de “Godzilla”, enquanto Derek Connolly foi um dos responsáveis por “Jurassic World”. Confesso a vocês que enquanto via aqueles monstros gigantes em ação, por várias vezes me bateu uma (leve) nostalgia de quando vi “Jurassic Park” pela primeira vez. Ou seja, se a intenção era fazer um filme de monstro divertido e envolvente, o objetivo foi completamente alcançado.

A direção de Vogt-Roberts tem personalidade. Ele aproveita a excelente qualidade dos efeitos visuais e parece gostar muito da beleza estética das imagens. Há um plano bem dramático e estiloso de Kong e Samuel L. Jackson olhando olho no olho. Além de muitos slow-motions, que servem para engrandecer o momento da cena, capta muitos closes das reações dos personagens e é capaz de aumentar a sensação de diferença de escala entre os humanos perante a Kong, às montanhas, árvores e outros animais da ilha. Infelizmente, convém dizer, ele pesa um pouco a mão neste recurso, exagerando com o passar do tempo.

O ponto fraco do filme é o roteiro. Como eu havia mencionado, o filme faz o possível para fugir dos mesmos caminhos tomados por seus antecessores, rejeitando alguns clichês. Inclusive, o primeiro ato dispõe até de bastante tempo para a escolha da equipe e ao tentar dar motivações e profundidade aos personagens (ao menos os principais, porque há muita gente nesse filme), algo que normalmente é ignorado em blockbusters – os recentes ‘Independence Day: O Ressurgimento’, ‘Caça-Fantasmas’ e o próprio ‘Tarzan’ são alguns exemplos.

Mas, infelizmente a mitologia por trás de Kong não é tão interessante quanto os momentos de ação do filme. Além de, por várias vezes, não respeitar a ‘lei da probabilidade’ da sua lógica interna, ou seja, há problemas de conveniência de roteiro que acabam incomodando e nos tirando do filme em algum momento. Um dos mais bizarros é em um cemitério cheio de gás, onde um personagem é repreendido por acender um cigarro. Entretanto, segundos depois outro personagem está usando um lança-chamas para se defender…

Se a história não é inovadora e chega a ser um tanto previsível em alguns momentos, ao menos os fãs das cenas de ação têm muito o que comemorar. Porque nada adiantaria uma bela qualidade visual se ela não fosse bem empregada em função do filme. E há várias sequências de ação extremamente empolgantes e muito bem dirigidas por Vogt-Roberts, como o massivo ataque de Kong aos helicópteros, enquanto jogavam bombas de ‘mapeamento’ da região.

Há várias referências a outros filmes de guerra, especialmente ‘Apocalypse Now’ – além do uso de napalm, um dos personagens solta a frase: ‘Está sentindo esse cheiro? É a morte’ (referência clara à frase de Robert Duvall no clássico de guerra). Quando John C. Reilly entra na trama, o filme cresce muito em humor e há também algumas mortes surpresa, solução encontrada para diminuir o inchado elenco. Falando em elenco, há grande diversidade de etnias, mas alguns parecem estar ali apenas fazendo número, sem relevância alguma para a trama.

O filme também conta com muitas músicas conhecidas (de bandas como David Bowie, CCR (ah vá?!) e Black Sabbath) e a trilha sonora composta por Henry Jackman (‘Capitão América: Guerra Civil’) é bem moderna, mesclando elementos de rock como riffs de guitarra com tambores tradicionais africanos, que agregam ao filme uma energia muito alta e contagiante. Pena que depois de um tempo o ritmo do filme cai bastante e as passagens de tempo com músicas (que ocorrem várias vezes) acabam entediando um pouco pela repetição.

Visualmente, o filme é impressionante, o melhor Kong que o cinema já viu. As outras criaturas são assustadoras e é claro, exóticas, um pavor para quem odeia insetos. Vale mencionar a boa fotografia de Larry Fong (‘Batman vs Superman’ e ‘300’) que consegue acomodar as criaturas neste ambiente de fantasia de uma forma bem ‘plausível’ para o espectador, uma bela construção de universo.

Dito tudo isso, ‘Kong: A Ilha da Caveira’ é um filme que se leva pouco a sério – menos que Godzilla e o próprio ‘King Kong’ anterior. Isso acaba sendo um fator positivo, pois permite mais momentos de descontração e diversão, que é o que procuramos em um blockbuster. Seu discurso de que ‘as vezes o inimigo não existe’, o tradicional debate homem versus natureza ou a incompreensão da guerra (que os soldados são obrigados a seguir ordens de superiores muitas vezes irracionais) é vagamente explorado e sempre em tom de piada, como uma leve sátira.

Mas, pesando prós e contras, o saldo é bem positivo. A direção tenta variar alguns planos e fugir da repetição para compensar a história batida e o filme tem êxito naquilo que propõe: muita ação, personagens principais convincentes e o principal, um King Kong enorme e bem feito, que consegue impor muito respeito. Se um dos grandes desafios em uma sequência/remake é trazer algo novo dentro daquilo que o público já conhece, as modificações feitas em ‘Kong: A Ilha da Caveira’ merecem todos os elogios.

PS: há uma cena pós créditos.

E você, já assistiu ou está ansioso para ver? Concorda ou discorda da análise? Deixe seu comentário ou crítica (educadamente) e até a próxima!




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