E esta estrutura talvez seja o maior “problema” de “Southpaw” (“Nocaute”) dirigido por Antoine Fuqua (“O Protetor” – 2014). Depois de cerca de 20 minutos acontece o “nocaute” na vida do boxeador. Após, no entanto, o telespectador já começa a imaginar e quase prever a sequência de cenas e o que acontecerá no destino do personagem de Jake Gyllenhaal. E isso dura até a última cena, infelizmente. Não há mais nenhum “golpe surpresa”. O que gera um conforto como o sentimento de segurança como quando se assiste um filme pela segunda vez.
Porém, quando o roteiro é simplório e previsível, o que salva – isso vale para todos os temas – é o como ele é feito. E é aí que surgem vários e vários destaques positivos. Fuqua construiu uma trama contagiante que prende o público e que flutua entre momentos intensos e leves de drama. O diretor constrói boas cenas intensas como no quase suicídio de Billy ou no momento em que ele se encontra ensanguentado após uma derrota, chorando pelado, sentado no chão quase em posição fetal chamando por ajuda. O herói, forte, pai de família, mostra-se fragilizado e abatido. O que é interessante, pois cria-se uma comparação automática com a mesma cena (praticamente) do início do longa, só que ainda com Hope no auge. O humor pontual dá rápidos momentos de alívio e não prejudica.
Os bons sons das pancadas nos rostos dão um tom ainda mais realista, obviamente, combinado as coreografias entre punho e cabeça dos lutadores. A ótima maquiagem traz o sangue, machucados e inchaços dando mais veemência à obra. Os mais sensíveis podem até ficar enojados…
Mas o melhor é o coletivo de interpretações. Todos estão muito bem. Se, como dito, a história não é original, os personagens compensam com muita “humanidade” ao fugir de estereótipos. O primeiro “tapa” vem com “Maureen Hope” (Rachel McAdams – “Meninas Malvadas” de 2004). Ela surge linda e loira, com salto alto, vestido apertado e bajulando o lutador. O preconceito pode gerar em um primeiro momento que Maureen é fútil e interesseira, mas na verdade, ela se mostra muito amorosa ao se preocupar com o marido (incentivando até que este pare de subir no ringue por questões de saúde) e com a filha.
O destaque, é claro, vai para Gyllenhaal. Uma década antes, ele chamava atenção como um brilhante jovem estudante de matemática em “The Day After Tomorrow” (“O Dia Depois de Amanhã” – 2004) e como um cowboy homossexual em “Brokeback Mountain” (“O Segredo de Brokeback Mountain” – 2005). Aqui ele se transforma em um “casca grossa”. Billy Hope poderia ser um atleta pedante afogado em arrogância, porém, pelo contrário, é apaixonado desde a infância pela esposa, é atencioso e carinhoso com a filha e grato pelos amigos. Características tão normais que geram um efeito, surpreendente, de quebra de expectativa e assim ocorre empatia com quem assiste. O público acaba por torcer literalmente por ele. Mérito de Antoine Fuqua e Jake Gyllenhaal.
Forest Whitaker faz “Titus ‘Tick’ Wills” (“O Último Rei da Escócia” de 2006) dono de uma academia de boxe na periferia da cidade. Ele produz um trabalho social com crianças pobres treinando-as para que não caiam no mundo do crime. Ele é o principal responsável pela re-ascensão de Billy. E ao lado de Jake constroem uma bela química e certos momentos cômicos entre discussões, risos e goles de uísque.
“…Ninguém vai bater tão duro como a vida. Mas não se trata de bater duro. Se trata de quanto você consegue apanhar e seguir em frente. O quanto você é capaz de agüentar e continuar tentando.” BALBOA, Rocky (Sylvester Stallone em “Rocky Balboa” – 2006). Ah a vida… Este “adversário” foi completamente impiedoso com o “Billy Hope”.
Por Afonso Rodrigues
Trailer do Filme: