Diante de um cenário dominado por Disney, Pixar e Ghibli nas produções animadas, a Illumination chegou em 2010 – três anos após sua fundação – com a intenção clara de diversão através de – podemos chamar assim – a obra mais significativa da produtora até agora: Meu Malvado Favorito. O brilhantismo envolta da narrativa demonstrou poderio único não só pela história isolada, mas pelos personagens cativantes, que atingiram o ápice de virarem a marca da empresa.
Essa estratégia da Illumination remete muito ao início da Dreamworks, com seus longas menos emotivos e simbólicos comparado aos rivais (mas não que não exista esses tons), com um foco farto na jornada divertida envolvendo bons coadjuvantes – algo que acontece com Shrek (2001) e Caminho Para ElDorado (2000), por exemplo. Porém, do mesmo modo que a Dreamworks não se sustentou com só uma franquia, a Illumination precisou se arriscar com novas (ou nem tanto assim) histórias, e como O Lorax: Em Busca da Trúfula Perdida (2012), Sing – Quem Canta Seus Males Espanta (2016) e O Grinch (2018) não resultaram como o esperado, o peso ficou com os bichos de estimação.
Enquanto em 2016, Pets – A Vida Secreta dos Bichos fez seu sucesso se aproveitando muito (exageradamente, no caso) da narrativa já muito bem trabalhada em Toy Story – e também um pouco da sequência – três anos depois da estreia, Chris Renaud (encabeçado pelas principais obras da empresa) assume a responsabilidade de estender a história de Max e Duke para repetir a mesma diversão que o primeiro oferece – pelo menos, para grande parte do público.
O principal problema da produção de 2016 está em seu deleite por obras já muito queridas, sem acrescentar algo totalmente inovador, tanto na narrativa quanto na temática, o que torna sua jornada algo exaustivo. Pets 2, por sua vez, supera esse segundo problema com uma narrativa bem mais divertida e cômica ao primeiro filme. Brian Lynch (que teve a cooperação de outros dois roteiristas no longa anterior) se demonstrou mais solto para a construção da jornada dos personagens, mas ainda desorientado diante suas divisões de núcleos.
O aproveitamento de Toy Story diante a primeira história faz com que Pets divide seus personagens em duas estruturas narrativas, uma de Max e Duke perdidos pela cidade em busca do caminho de volta para casa – em paralelo da necessidade de um relacionamento saudável entre os dois – e seus amigos buscando meios de ajuda-los. Ainda que a diversão não esteja tão presente, a estabilidade do texto é bem maior, já que as duas estruturas são orgânicas e encontram uma convergência natural. Em Pets 2, mesmo que Lynch entregue um tom cômico bem mais poderoso, o roteiro se perde em seus – agora – três núcleos. Inicialmente, não há um problema narrativo tão grave, mas que foi se provando inconsistente até uma união de histórias nada natural, mas ainda assim, previsível.
Tanto Lynch quanto Renaud se aproveitaram de seus personagens mais queridos do primeiro longa para a construção da história, o que faz todo o protagonismo de Max e Duke se perder completamente. Pets 2, então, deixa de assumir o manto de “vida secreta dos bichos” para uma divertida aventura com bichos de estimação, e nela, estão presentes diferentes conceitos em cada núcleo, sendo um distante do outro.
No caso, o texto trabalha Max e Duke em uma jornada de conhecimento fora da cidade grande para com a vida no campo. Nele, Lynch se apoia de um discurso analítico envolvendo crianças (mas conseguindo conversar paralelamente com os próprios animais) sobre os diferentes modos de vida, incluindo, assim, discussões sobre o exagero da proteção e o modo de enfrentar seus medos. Por mais que sejam temas indispensáveis, é algo recorrente em jornadas de personagens com diferentes mundos, como Maurício de Sousa trabalhou com Chico Bento e seu primo Zeca, ou até mesmo Banzé em A Dama e o Vagabundo 2.
Nesse ponto, é perceptível a falta de coragem em querer construir a mesma originalidade presente em Meu Malvado Favorito. Porém, o núcleo em si é divertido e bem explorado, muito pela presença do personagem Rooster, responsável pela lição da vida “raiz”. Imponente, é funcional como o contraponto da visão de Max e importante para elevar o cãozinho do primeiro filme, dando a sua, então esperada, evolução. A frustração, no caso, existe pela narrativa mudar o foco constantemente para os outros dois núcleos, mesmo que esse apresente força suficiente para segurar o longa inteiro.
A necessidade de elevação em sequências provoca resultados decepcionantes no ponto de vista da obrigatoriedade de aumentar trechos ou estruturas. No afastamento de Max e Duke do protagonismo, os outros dois focos ficaram com a cachorrinha Gigi e o coelhinho Bola de Neve em suas próprias aventuras. Como comentado, o surgimento dessa divisão é introduzida de maneira artificial.
O texto de Lynch entrega pontos únicos para justificar a convergência no início, mas nada coeso o suficiente para manter a força estrutural. Isso porque o ponto de Gigi conversa indiretamente com a parte dos outros dois personagens, ainda que seja dentro de uma realidade extremamente agradável, realizando comparações cômicas entre cachorros e gatos. O resultado é uma jornada recreativa ao público, mas nada empolgante comparado com o núcleo dos dois cães principais. Bola de Neve passa pelo mesmo problema em sua trajetória épica e brincalhona (com tons irônicos sobre o cenário de “filmes de herói”). No entanto, a disfunção de seu núcleo é ainda mais gritante, já que existe um exagero narrativo desnecessário e nada empolgante. A união do coelhinho com a cachorrinha Chloe não é o maior dos problemas, porém Lynch escolheu construir uma estrutura também digna de um longa, com uma introdução de realidade torturadora, um grande vilão e seus “soldados” para impedir o grande feito do herói. O resultado disso é uma história corrida e longe de ser bem trabalhada, ainda que haja um aproveitamento do tema central de Madagascar 3: Os Procurados (2012) e um discurso clichê envolta da realidade circense.
Como pontuado, há uma boa construção de relação entre os dois personagens. No entanto, ambos residem em um núcleo mal estabelecido, além de serem encaixados em momentos inoportunos. A montagem do longa não encontra um encaixe saudável das histórias, já que, as mudanças de jornadas são realizadas nos momentos mais agradáveis das mesmas. E então, há a aguardada – e decepcionante – união dos três. Enquanto Toy Story consegue demonstrar uma costura saudável entre suas estruturas, Pets 2 falha em querer fazer muito quando se é exigido pouco. Os três funcionam bem separadamente, com suas próprias influências e temáticas, mas não conseguem encontrar o equilíbrio para a união conclusiva, dando um tom desnecessariamente exagerado, chegando a repetir a fórmula do primeiro ao colocar animais na direção de automóveis – escolha também nada original.
Com essas observações, a diversão de Pets 2 não sustenta a problemática narrativa estruturada de Lynch e Renaud e mantém – ainda – os Minions como os principais pets da Illumination.